terça-feira, 21 de julho de 2009

O MONTE DA PARADAIA, continua a ser mutilado por uma exploração de granito.

"Na sequência do artigo do mês passado “Dossier da Paradaia – impacte ambiental e arqueológico”, procurei investigar a origem do topónimo Paradaia, que dá o nome ao monte existente na freguesia de Romãs. Esta tarefa revelou-se difícil, tendo mesmo verificado que o topónimo Paradaia não aparece no Reportório Toponímico de Portugal. Por outro lado, o local vem assinalado nas memórias paroquiais de 1758 como o monte do Barrocal. Assim, do topónimo Paradaia apenas conheço as referências que a ele fazem os meus vizinhos e o facto de constar na monografia “Terras do concelho de Sátão”, do saudoso cónego Albano de Sousa, em edição da Câmara Municipal de Sátão. Do que diz este livro sobre a Paradaia já tratei no meu artigo do mês passado. Encontrei agora na internet um texto que começa assim: “Ainda o sol mal tinha esfregado os olhos, atrás do monte da Paradaia, já a tia Elvira tinha o lume aceso”. A sequência completa do texto pode ser encontrada no título Escrevinhar I que consta do blog escreverpalavras.blogs.sapo.pt. Não encontrei o nome do autor do blog, mas aqui fica mais uma expressão do sentimento que os habitantes locais têm pelo seu magnífico monte.
Foi também pela internet que obtive uma preciosa colaboração para a interpretação do topónimo Paradaia. O que se segue, devo à amabilidade de Manuel Carvalho, mestre em estudos portugueses pela Universidade de Aveiro e investigador de toponímia portuguesa. Após constatar a existência na encosta do monte da capela da Senhora do Barrocal e da romaria de Nossa Senhora das Candeias ou da Fevereirinha, porque se realiza no dia 2 de Fevereiro, formula a seguinte hipótese:
Esta romaria corresponderá, quase pela certa, considerando as particularidades do lugar e os respectivos achados, à cristianização do festival celta do primeiro dia de Fevereiro, conhecido por Imbolc "Purificação" ou Dia da Senhora, que honrava a deusa Brigitt, «filha do deus Dagda, a deusa tripla dos cabelos de ouro. Era a mãe, a filha e a esposa dos deuses das origens e dos primeiros druidas. Personificava a poesia, a saúde, a força, a adivinhação, a inteligência e protegia o lar». O processo da cristianização, perante a dificuldade em erradicar as múltiplas manifestações da religião e dos costumes pagãos, transformou esta deusa Brígida em Santa Brígida, arvorando-a em padroeira da Irlanda, com culto generalizado nesse mesmo dia 1 de Fevereiro.
A ocupação romana trouxe consigo um pouco de todo o império, incluindo, como não podia deixar de ser, a sua religião, abrindo caminho a novos sincretismos.
Neste mesmo mês de Fevereiro, entre os dias 13 e 21, a velha Roma promovia um dos seus maiores festivais religiosos, que pretendia honrar os mortos e aproximar os membros da família, envolvidos na visita aos túmulos dos seus familiares, onde levavam flores e oferendas de sal e de pão embebido em vinho.
Considerando as características do Monte da Paradaia e a existência ali de uma necrópole, pensamos ter encontrado a resposta para a origem deste topónimo no festival religioso a que acabámos de aludir. A legitimação desta hipótese, que até o nome da freguesia parece confirmar, deixamo-la a cargo de quem melhor a pode fazer: a Arqueologia.
Parentalia, era o nome deste festival, e daqui podia derivar o nome Paradaia, mediante fenómenos fonéticos presentes na formação da língua portuguesa: Parentalia > *parantalia (assimilação da segunda sílaba por influência das envolventes) > *paratalia (assimilação progressiva da segunda sílaba por desnasalação) > *paradalia (por sonorização do intervocálico -t- > -d-) > Paradaia (por síncope do -l- intervocálico).
Esta interessante hipótese para a origem do topónimo Paradaia está publicada no blog do autor deaveiroeportugal.blogspot.com.
Quanto ao monte da Paradaia, protagonista desta história, continua a ser mutilado por uma exploração de granito no local, conforme documenta a fotografia. Associa-se assim, ironicamente, a sua função antiga ao seu estado actual: é de bradar aos céus!"

Abel Estefânio
Economista
aestefanio@hotmail.com

In "Gazeta de Sátão"

Nenhum comentário: